Como sabemos é impossível pensar na sobrevivência dos seres vivos da terra sem água. A água simplesmente influencia e faz parte de tudo - Compõe alimentos, nutre os seres vivos, ajuda na remoção de bactérias, protozoários e outros organismos, substâncias venenosas, teor excessivo de compostos orgânicos. Sob este aspecto a água tem influência decisiva sobre: controle e prevenção de doenças; hábitos higiênicos, como asseio corporal e limpeza em geral; serviços de limpeza pública e práticas esportivas e recreativas. E tudo isso sem contar a influência da água sobre a parte econômica : redução da corrosividade, dureza, ferro etc. O aspecto econômico proporciona: aumento de vida média da população; diminuição da mortalidade em geral e, em particular, da infantil; redução de horas de trabalho perdidas com diversas doenças e desenvolvimento industrial, conduzindo, pelo progresso material, a elevação do padrão de vida da comunidade (saneamento básico).
Um dos princípios básicos na gestão da água doce, como recurso escasso, está na transmissão aos utilizadores do custo efectivo das suas decisões, para prevenir o desperdício e promover a poupança do recurso. Agora, com o novo REF, podemos considerar que finalmente se está a caminhar para a aplicação de uma efectiva recuperação de custos.
Sabendo que todos esses aspectos de consumo de água das pessoas automaticamente mexe com a economia, é possível ter uma visão geral sobre a influência desses aspectos na economia de um país inteiro. Um exemplo muito claro disso, é o saneamento básico, este proporcionado à inúmeras comunidades e regiões pobres contidas em um país subdesenvolvido. E tudo isso entra na questão política, geográfica, estética e econômica de uma cidade, logo, do país em si.
No dia 22 de Março celebrou-se, mais uma vez, o Dia Mundial da Água. Desde a Cimeira do Rio em 1992 que as Nações Unidas decidiram reconhecer a importância fulcral do recurso que dá a cor azul ao nosso planeta e que define a vida que nele se encontra. Este ano a efeméride parece não ter tido grande eco em Portugal, talvez porque ocorreu em pleno fim-de-semana de Páscoa, ou porque a chuva que por aqui caiu neste final de Inverno afastou por agora o espectro de seca que se vinha aproximando. Em todo o caso, o tema escolhido pela ONU para este ano foi o saneamento básico, reconhecendo o papel que um tratamento adequado dos efluentes tem para a saúde pública bem como para a qualidade ambiental. Os Objectivos do Milénio (MDG) neste sector ainda estão bem longe de serem atingidos, prevendo-se que em 2015 existam mais de 2 mil milhões de pessoas sem acesso a saneamento.
No caso português, a publicação de legislação adequada a uma gestão correcta dos recursos hídricos tem sido realmente muito lenta, mostrando que também aqui a inconstância da tal vontade política. Neste mês de Março assistimos finalmente à publicação do Regime Económico e Financeiro (REF) da Água, que era esperado desde a publicação da Lei da Água em Dezembro de 2005, sendo que esta por sua vez tardou 5 anos a aparecer após a publicação da Directiva-Quadro da Água! E recorde-se que o regime financeiro da utilização de recursos hídricos cuja aplicação estava prevista desde 1994 nunca chegou a ser efectivamente aplicado pois nunca saíram as portarias que deveriam estabelecer os valores a aplicar…
Adiante, que águas passadas não movem moinhos.
Um dos princípios básicos na gestão da água doce, como recurso escasso que é, traduz-se na transmissão aos utilizadores do custo efectivo das suas decisões, para prevenir o desperdício e promover a poupança do recurso. Quando os utilizadores não recebem um sinal claro das consequências das suas acções, o seu benefício privado é comparado com o seu custo individual, esquecendo os custos que estão a impor a todos os que têm alguma ligação aos ecossistemas aquáticos (em última análise, todos!). Com efeito, a Directiva indica o princípio da recuperação dos custos, incluindo os custos ambientais e de escassez, como um dos pilares de uma gestão adequada, tendo como objectivo a obtenção de um bom estado ecológico das massas de água por essa Europa fora. Em Portugal ainda estamos longe da recuperação de custos financeiros mesmo nos sistemas urbanos, com níveis que em 2005 rondavam os 76% (dados INSAAR 2005), e isto não inclui ainda os custos ambientais e de escassez que podem, em locais e épocas específicas, ser muito significativos. Os tarifários existentes, de tão complexos e díspares, apresentam sérias falhas do ponto de vista da racionalidade económica e mesmo do senso comum, e não existia nenhum mecanismo legal de recuperação dos custos externos às entidades gestoras.
Agora, com o novo REF, podemos considerar que se está a caminhar para a aplicação de uma efetiva recuperação de custos. Apesar de a versão definitiva do Decreto-Lei não ter ainda sido publicada, é já sabido que o principal instrumento preconizado é a taxa de recursos hídricos, que engloba cinco diferentes componentes (chamadas, curiosamente, AEIOU, onde A - Aproveitamento de águas do domínio público hídrico, E – descarga de Efluentes, I – extracção de Inertes, O – Ocupação do domínio público hídrico e U – Utilização susceptível de causar impacto significativo). Assim, ao contrário do que era feito na legislação anterior, o REF reconhece que todos os utilizadores com impacto devem contribuir para a boa gestão do recurso, e não apenas os utilizadores do domínio público hídrico. A nova legislação inclui, também, um coeficiente de escassez que poderá variar consoante as condições climáticas. É de salientar que o sector agrícola e o sector hidroeléctrico, principais utilizadores dos recursos hídricos (consumptivo e não consumptivo, respectivamente), estão incluídos e terão, desta vez, de dar o seu contributo. Talvez passem a tratar o recurso com um pouco mais de cuidado.
Além da taxa de recursos hídricos, cujo objectivo é racionalizar a utilização através da transmissão dos custos externos aos sistemas de abastecimento e saneamento, o REF apresenta ainda algumas regras para as tarifas dos serviços públicos de água, que se espera venham a melhorar a confusão reinante no sector no que diz respeito à recuperação dos custos financeiros. Os utilizadores dos recursos hídricos vão pagar mais, mas o objectivo da legislação não pode ser só arrecadar mais receita. Confiemos que para além de se pagar mais, se pague melhor, ou seja, que aquilo que é pago reflicta as consequências da utilização de cada um. Só assim valerá a pena!
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